Movimento antivacina nos EUA pode fazer ressurgir surtos de doenças
Eloá OrazemBrasil de Fato | Los Angeles (EUA)
Na última semana, um homem de 20 e poucos anos foi diagnosticado com poliomielite, em Nova York. O jovem, que não era vacinado contra esse vírus, é o primeiro caso conhecido no país em mais de uma década. “Esse caso de polio, em Nova York, só nos mostra que, às vezes, nos esquecemos dessas doenças que podem ser prevenidas, e aí muita gente acha que a vacina nem é mais necessária. Mas esses vírus estão aí e eles vão voltar caso não mantenhamos os níveis de vacinação em alta”, disse Svea Closser, antropóloga médica na Johns Hopkins Bloomberg School of Public Health à reportagem do Brasil de Fato.
Segundo ela, não é caso para desespero, mas sim para que tal diagnóstico sirva de lembrete sobre o cuidado necessário. Esse não parece ser, contudo, um conselho que os estadunidenses estejam dispostos a seguir. O país mais rico do mundo foi também o primeiro a disponibilizar, gratuitamente, vacinas contra a covid-19 – doença que matou mais de um milhão de pessoas no país. Apesar da ampla oferta, sem nenhum custo, a campanha de vacinação no país foi um fracasso. Cerca de 69% da população norte-americana está totalmente imunizada contra a covid.
Essa marca baixa se deve ao movimento antivacina e às diversas informações falsas compartilhadas sobre os imunizantes. Houve, nos Estados Unidos, boatos de que a vacina seria usada para espionagem, que ela teria grandes efeitos colaterais e outras falácias.
Nada disso, porém, surpreende o pediatra Paul Offit, que atua também como Diretor do Centro de Educação de Vacinas. “O movimento antivacina começou após a primeira vacina, no início de 1800. Portanto, não há nada de novo aqui”, explica.
De acordo com o médico, no cerne desta questão estão as pessoas que não gostam de ter as vacinas como algo obrigatório. “Eles não querem sentir que estão em uma posição em que precisam se vacinar ou vacinar seus filhos, mas eu dividiria isso em vários grupos”. E continua: “acho que, por um lado, você tem pessoas céticas em relação às vacinas. Essas são pessoas que querem ter certeza de que o que estão colocando em seu corpo ou no corpo de seus filhos foi testado adequadamente. Neste ponto, acho que sou cético em relação a vacinas porque quero ter certeza e quero os dados antes de tomar um imunizante ou pedir aos meus filhos que tomem uma vacina. Mas então há os cínicos. Essas são as pessoas antivacinas. Eles são teóricos da conspiração; acreditam que as empresas farmacêuticas controlam tudo, que as empresas farmacêuticas estão mentindo para eles, que as empresas farmacêuticas controlam o governo, controlam e o estabelecimento médico. Esses não serão convencidos por dados ou razão alguma”.
O problema é que, com a descrença desses cínicos, ficamos todos mais vulneráveis. Um bom exemplo disso é o surto de varíola dos macacos, cujo surto, em solo americano, foi registrado no final de maio.
A doença também pode ser prevenida por vacina, mas a baixa taxa de adesão no país deixou muita gente sujeita à doença, que não tem tratamento específico.
Apesar do medo da doença, muita gente prefere correr o risco do que enfrentar os efeitos colaterais de imunizantes. “Eu sei que há um ou outro pequeno risco ao se tomar uma vacina. Eu mesma tive alguns sintomas quando tomei a minha dose contra a covid, mas eu achei que valeria a pena. Não apenas por mim, para me proteger, mas também por conta de quem me cerca. Tomo vacinas por mim e, principalmente, pelas pessoas mais vulneráveis que fazem parte da nossa sociedade”, completa Svea.
Para o Dr. Offit, qualquer argumento individualista é inapropriado neste contexto: “Você é um membro da sociedade aqui. Não é seu direito pegar e transmitir uma infecção potencialmente fatal. Quando você vê surtos de sarampo, por exemplo, como vimos recentemente na cidade de Nova York, os pais dirão: ‘bem, não quero vacina para mim nem para meus filhos’. Mas isso não coloca em risco apenas seus filhos, coloca em risco também os filhos de outras pessoas. Ou seja, você não está apenas tomando uma decisão por você ou por sua família, mas por todos nós. E quando se trata de infecções potencialmente fatais, a decisão não é sua.”
Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil