Na Cúpula do Clima, Bolsonaro mente sobre verba para fiscalização ambiental no Brasil
Presidente afirmou que o Brasil está na vanguarda do combate ao aquecimento global O presidente do Brasil, Jair Bolsonaro (sem partido), discursou para a Cúpula de Líderes sobre o Clima, convocada por Joe Biden, presidente dos Estados Unidos, tentando afastar do país o título de pária ambiental, por meio de mentiras sobre a sua gestão acerca do meio ambiente.
O capitão reformado afirmou que o Brasil é “voz ativa” na construção da agenda ambiental e elogiou a “revolução verde”, que, através de ciência e inovação, teria tornado nossa agricultura sustentável.
Distante, na fila dos discursos, dos líderes das maiores economias do mundo, Bolsonaro também se manteve distante da realidade do próprio país, ao afirmar que tem implementado renovados investimentos em energias sustentáveis e duplicado os recursos destinados às ações de fiscalizações. O presidente também disse que o Brasil está na vanguarda do combate ao aquecimento global.
Realidade em números
No entanto, todas as operações de combate ao desmatamento ilegal na Amazônia e às queimadas no Pantanal sofreram baixas desde o início do governo Bolsonaro.
Somente neste ano, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) perdeu 4% em corte de verba. No caso do Instituto Chico Mendes (ICMBio), a redução foi ainda mais drástica, cerca de 12%. Ambos são órgãos responsáveis pelo trabalho de preservação ambiental no país.
No ano passado, também houve um bloqueio financeiro de aproximadamente R$ 60 milhões que seriam destinados ao Ibama (R$ 20,9 milhões) e ao ICMBio (R$ 39,7 milhões).
Em 2019, primeiro ano do governo Bolsonaro, os recursos para iniciativas de implementação da Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC) tiveram um corte de R$ 11,2 milhões, o equivalente a 95% de corte no orçamento.
A diminuição dos recursos foi resultado do contingenciamento de R$ 187 milhões no Ministério do Meio Ambiente (MMA), após o decreto n° 9741 em março de 2019.
Quanto aos dados de desmatamento na Amazônia, foram 11.088 km2 desmatados entre janeiro e novembro de 2020, a maior área registrada nos últimos 12 anos. Houve crescimento de 9,5% em relação a 2019, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), órgão federal que monitora a devastação nos biomas brasileiros por meio de satélites.
A devastação alcançou índice 70% maior do que a média registrada entre 2009 a 2018. Para cumprir a meta da PNMC, o país precisaria ter um teto de desmatamento em 3.925 km2 este ano. O total registrado é 180% superior.
Cúpula do Clima
O evento virtual que se iniciou nesta quinta-feira (22) reúne 40 líderes mundiais e marca o retorno oficial dos EUA ao Acordo de Paris, um tratado no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU) que determina metas de redução de emissão de gases do efeito estufa, a fim de conter o aquecimento global.
Líderes mundiais que falaram antes de Bolsonaro reafirmaram o compromisso de frear o aquecimento global, por meio do desenvolvimento de formas sustentáveis de energia, diminuição de emissão de gases poluentes e que causam o efeito estufa, mobilidade sustentável, transferência de tecnologia entre os países, entre outras medidas.
Organizações questionam fala de Bolsonaro
Fabiana Alves, coordenadora de Clima e Justiça do Greenpeace, afirmou que Joe Biden não deveria estabelecer nenhum acordo com Jair Bolsonaro, enquanto o presidente brasileiro não demonstrar medidas concretas para conter a crise climática.
“O governo Bolsonaro reafirma acabar com desmatamento ilegal em 2030 e anuncia zerar emissões de carbono em 2050, porém não possui política pública para a contenção do desmatamento”, afirmou Alves. Para ela, “é impossível proteger a floresta dando fundos a alguém responsável por níveis recordes de desmatamento na Amazônia e violações dos direitos humanos. Em sua fala, ressalta o mercado de carbono como solução, dando às empresas de combustíveis fósseis um caminho para ‘compensar’ sua poluição com florestas, em vez de, de fato, reduzi-la.”
Em suas palavras, Bolsonaro também “valoriza as contribuições nacionais brasileiras ao Acordo de Paris, que neste momento estão sendo questionadas na justiça por serem menos ambiciosas que as anteriores”.
Por fim, disse que “a melhor forma de proteger a Amazônia é defendendo os direitos dos Povos Indígenas e das comunidades tradicionais, que são sistematicamente excluídos das políticas do governo atual”.
O Observatório do Clima também se posicionou sobre o discurso de Bolsonaro. Em nota, a organização destacou que o presidente escolheu deixar o Brasil de forada corrida rumo à recuperação verde e descarbonização econômica, prometida por EUA, China e União Europeia. Ao contrário: “o regime de Jair Bolsonaro prefere entregar” a região amazônica “a grileiros de terra, garimpeiros, pecuaristas predatórios e madeireiros ilegais. Tem sol, vento e biocombustível à vontade, mas prefere subsidiar petróleo. Regride na ambição de suas metas climáticas para admitir mais desmatamento e mais emissões quando o Acordo de Paris começa enfim a ser levado a sério”.
O observatório também afirmou que “Bolsonaro fez uma opção deliberada pelo atraso num momento em que as vantagens comparativas do país poderiam atrair investimentos, emprego e qualidade de vida para os brasileiros”. E complementou: “Espanto nenhum vindo de um líder que se aliou ao coronavírus contra a própria população, transformando o país num imenso cemitério”.
“Esta é a mais perfeita tradução da realidade brasileira neste momento de virada climática global: ver prestígio e recursos indo para outros países tropicais, enquanto ficamos com a Covid e o desmatamento. Ao perdedor, a boiada”, afirmou a organização em nota. (BF)