Nobel de Economia premia Claudia Goldin, estudiosa da desigualdade de gênero no trabalho
São Paulo – Professora na Universidade de Harvard, nos Estados Unidos, Claudia Goldin se tornou, nesta segunda-feira (9), a terceira mulher da história a vencer o Nobel de Economia desde a primeira edição do prêmio, em 1969. Aos 77 anos, a economista e doutora pela Universidade de Chicago foi reconhecida por seus estudos sobre mulheres no mercado de trabalho.
Antes dela, em 2009, a economista estadunidesnse Elinor Ostrom foi a primeira a conquistar a honraria, que levou em conta sua “análise da governança econômica, especialmente sobre os bens comuns”. Dez anos depois, o Nobel de Economia reconheceu a economista francesa Esther Duflo por estudos para reduzir a pobreza. Uma pesquisa conhecida por destacar que a recessão pode ser evitada mantendo empregos e salários o quanto for possível.
“A Real Academia Sueca de Ciências decidiu atribuir o Prêmio Sveriges Riksbank de Ciências Econômicas de 2023 em memória de Alfred Nobel a Claudia Goldin ‘por ter avançado a nossa compreensão dos resultados do mercado de trabalho das mulheres’”, anunciou a instituição organizadora do evento mais cedo.
Processo histórico
Nascida em Nova York, Claudia Goldin foi também a primeira mulher titular do departamento de Economia em Harvard. Em sua pesquisa, a professora vasculhou arquivos e compilou dados históricos sobre a participação das mulheres no mercado de trabalho ao longo dos séculos. Com base neste método, Claudia Goldin conseguiu apresentar fatos surpreendentes, de acordo com a Real Academia Sueca de Ciências, que deram uma “compreensão mais profunda dos fatores que afetam as oportunidades das mulheres no mercado de trabalho e na procura por trabalho”.
Papel de gênero e a desigualdade
O estudo mostra, por exemplo, que a participação feminina no mundo laboral não teve tendência ascendente ao longo de um período de 200 anos, mas sim uma curva em forma de U. A participação das mulheres casadas diminuiu com a transição de uma sociedade agrária para uma sociedade industrial no início do século 19. Mas começou a aumentar com o crescimento do setor dos serviços no início do século 20.
“Goldin explicou este padrão como o resultado de mudanças estruturais e da evolução das normas sociais relativas às responsabilidades das mulheres em relação ao lar e à família”, destacou a organização. A pesquisa da nova Nobel de Economia aponta como central em sua análise o fato de as escolhas das mulheres terem sido, frequentemente, limitadas pelo casamento e pela responsabilidade pelo lar e pela família. O que ainda continua a ocorrer. A conclusão da pesquisa é que a mudança levará tempo.
“Porque as escolhas que afetam carreiras inteiras baseiam-se em expectativas que mais tarde podem revelar-se falsas. Os seus conhecimentos vão muito além das fronteiras dos EUA e padrões semelhantes foram observados em muitos outros países. A sua investigação traz-nos uma melhor compreensão dos mercados de trabalho de ontem, de hoje e de amanhã”, observa a organização do prêmio.
Repercussão no Brasil
O anúncio repercutiu no Brasil, onde o mercado de trabalho segue reproduzindo desigualdades entre homens e mulheres. Uma pesquisa do Dieese revela que a população feminina é minoria na força de trabalho, e também maioria entre os desempregados. São as mulheres que têm as maiores taxas de subocupação e de desalento. E que ganham, em média, 21% a menos do que os homens. A desigualdade de gênero é ainda mais grave sob o recorte racial. No quesito salarial, as mulheres negras chegam a ganhar 48% a menos do que os homens brancos recebem em média. O dado é do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV).
“Enquanto um monte de gente, incluindo políticos importantes, no Brasil e no mundo, falam que não existe diferença na valorização do trabalho de homens e de mulheres, o Nobel de economia vai para uma economista que pesquisa…a mulher e questões de gênero no mercado de trabalho”, ironizou o perfil do podcast de política internacional Xadrez Verbal na rede X, antigo Twitter.
O economista Claudio Ferraz também lembrou que a pesquisa de Claudia Goldin mostrou como a introdução da pílula anti-concepcional ajudou as mulheres no mercado de trabalho. Assim como “as entrevistas ‘cegas’ para a orquestra sinfônica reduziram a discriminação”. “Prêmio Nobel mais do que merecido para Claudia Goldin”, escreveu.
‘Sempre me considerei uma detetive’
Após o anúncio, o secretário-geral da Academia Real Sueca de Ciência, Hans Ellegren, afirmou que a premiada ficou “surpresa e muito, muito feliz”. Em entrevista à instituição, Claudia Goldin destacou que sempre se considerou uma “detetive” em suas pesquisas. “O detetive sempre acredita que há uma maneira de encontrar a resposta e é assim que sempre pesquisei”, afirmou a professora.
Concedido desde 1901, o prêmio Nobel foi criado a partir da fortuna deixada por Alfred Nobel (1833-1896), químico e inventor sueco que criou a dinamite. Inicialmente, a premiação contava com cinco categorias: paz, literatura, química, física e medicina. Até que em 1969 passou a incluir também o de economia. (RBA)
Foto: Arquivo Pessoal